domingo, fevereiro 06, 2005

Histórias

Ela senta-se cansada numa cadeira. Em seu redor tachos e panelas recolhem as gotas de água que caiem do tecto. Lá fora chove, cá dentro o estuque das paredes ameaça cair, a madeira do tecto apodrece, a cozinha sem janelas é lar de vários carreiros de formigas. Em cima da mesa um saco cheio de roupa para criança que foi dado por pessoas amigas. Ela levanta a cabeça e olha para a sua pequena filha que brinca com um peluche em cima do sofá velho. "Tão inocente," pensa "faria qualquer coisa por aquele sorriso!"
Ela vai até à cozinha e abre o frigorífico, está quase vazio. Final do mês e o pouco dinheiro ganho já não existe. "Pelo menos amanhã é Sábado e ele já estará em casa." O marido passa a semana inteira fora a trabalhar por uns tostões. Ela lembra-se do último fim-de-semana que ele esteve em casa, um rato caiu pela chaminé da cozinha abaixo e a confusão depois disso, os dois a ver se o apanhavam munidos de uma vassoura e de Raid para atordoar o animal. Ela ri-se, na altura não achou piada mas agora ri-se. Os problemas têm menos importancia quando não se está só. O barulho da porta a abrir-se fá-la virar-se, ele chegou mais cedo! A filha salta do sofá e corre para os braços do pai que a elevam no ar.
"Passarei fome se for preciso mas farei poupar todos os escudos que puder. Tenho a certeza! Sairemos deste buraco para uma casa melhor, a nossa filha irá para a universidade. As coisas serão melhores no futuro, tenho a certeza!" sonhou ela.